02/03
Hoje foi um dia impressionante .
Saímos literalmente numa jaula, armada na carroceria de uma caminhonete que nos levou por cerca de 30 minutos pelas ruas da cidade o que já causa uma grande impressão pelo estado de destruição em que se encontra , é impactante a quantidade de escombros que existe , o transito caótico ,a infra estrutura precária, o acumulo de lixo e plásticos nas ruas e esgotos , a miséria da população, a quantidade de crianças ,a super povoação .Também é notável nas calçadas a quantidade de pessoas vendendo produtos quase sempre importados devido a falta de industrias no pais, a impressão que se tem é que a cidade é um grande mercado negro em meio a escombros.
Éramos 3 médicos brasileiros ,1 chileno,2 cubanos ,1 haitiano que ajudava na tradução , e os 2 companheiros de epidemiologia que levavam suas bazucas de fumaça para eliminar vetores. O destino era um acampamento onde se encontravam crianças órfãs . Chegamos ,preparamos os materiais e medicamentos ,tirei algumas fotos do local e antes de iniciar a jornada o Psiquiatra Dr. Francisco ,uma pessoa admirável pela serenidade e inteligência , que tem como função na missão cuidar da saúde mental dos demais profissionais que aqui atuamos ,numa de suas raras saídas a campo -para não colocar em risco sua própria saúde mental- junto com algumas responsáveis pelo orfanato reuniu as crianças para ler um conto em Kreól (dialeto local) e entoarem cantos locais onde todos nos divertimos e nos movemos com a energia do momento. O olhar e o sorriso daquelas crianças era algo muito marcante ,uma mistura de profunda tristeza com a inocência e fragilidade das crianças que nos comoveu profundamente. Mas demos inicio a jornada de trabalho, o calor era muito intenso desde cedo , dentro de uma barraca grande ,branca ,que tinha um cartaz na entrada “doado pela Suíça”, engraçado fazer propaganda do que se doa ,pero Bueno....Em alguns minutos de iniciado o trabalho dezenas de pessoas se amontoavam para receber atendimento. A tradução a cargo da companheira haitiana era insuficiente para os 4 médicos e tínhamos que tratar de comunicarmos com algumas poucas palavras em Kreól que havíamos aprendido ,misturado com algo de francês ,um pouco de mímica , alguns pacientes que arrastavam inglês ou espanhol também facilitava a comunicação.
Já pelo meio dia uma pausa para tomar um copo de suco e algumas bolachas que havíamos trazido do acampamento ,quando sentados na sombra de uma arvore ao nosso lado se encontravam dois homens sentados num colchonete no chão onde dormia uma criança de menos de 1 ano , um deles nos falou algo em espanhol ,imediatamente o convidei para nos ajudar com o idioma ele respondeu que sim e após lancharmos e conversar um pouco o chamei novamente e ele de uma forma um pouco fria me disse que iria depois. Segui o trabalho um pouco decepcionado porque senti que o homem estava arrependido do compromisso , quando para minha surpresa após alguns minutos aparece bem vestido e arrumado , sorridente e disposto a cooperar sem pedir nada em troca. Depois disso pude junto ao novo amigo tradutor agilizar o trabalho e atender praticamente o dobro de pacientes que poderia ter feito estando só .
Ao final o companheiro empolgado queria saber se regressaríamos no dia seguinte mas infelizmente não controlávamos esta informação , pensei em dizer a ele que fosse ao acampamento pela manha para acompanhar nosso grupo mas devido a distancia e a dificuldade com o transporte me dei conta que talvez fosse a ultima vez que o estaríamos vendo .
Próximo as três da tarde quando encerramos os atendimentos ,antes de partir , as responsáveis pelo orfanato se preocuparam em nos recompensar pelo trabalho e amavelmente nos trouxeram umas caixinhas de isopor com arroz misturado a um tipo de pimenta temperado com canela , pedaços de banana frita e um pedaço de carne que acredito era de carneiro . Me senti constrangido com aquele banquete frente aquelas crianças humildes que também tinham almoço ,mas não queria desapontar as senhoras que com certeza não mediram esforços para nos agradar e confesso que comi com uma mescla de culpa e vergonha .Enquanto comia me dei conta que o tempo havia passado rapidamente e envolvido com a dinâmica do atendimento não tinha aproveitado um tempo a sós com as crianças .Rapidamente tratei de engolir a comida e antes mesmo de terminar levantei e pedi para reuni-las que queria tirar algumas fotos . Foi com certeza o momento mais emocionante do dia , se aproximaram e quando dei por mim estava rodeado de crianças que me tocavam o cabelo , puxavam minha barba e estivemos algum tempo ali juntos.Quando terminou discretamente sai da barraca ,procurei um canto tranqüilo e chorei.
Espaço criado para discussão sobre a integração da America Latina, seus povos, seus problemas, lutas e sonhos.
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Oi Adriano, sou aqui de cruzeiro não sei se vc se lembra,mas me lembro bem de vc mais conhecido como macarrão! Fiquei impressionada com seu diário que me fez pensar na vida, as vezes reclamamos por tão pouco e não conseguimos olhar ao nosso redor. O que vc está vivenciando aí é uma experiencia que não tem preço,acredito que sua vida mudou depois disso, agradeço por compartilhar conosco! Fico feliz em saber que existem pessoas como vc no mundo! Nós de Cruzeiro estamos muito orgulhosos de você, continue sempre e Deus abençoe sua Vida! Grande Abraço.
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